BOM, ISSO JÁ TODA A GENTE SABIA . . . MAS, E AGORA ? . . .
REVISTA ÉPOCA
10-11-2012
Como o jogo do bicho usa
escolas de samba cariocas para desviar recursos públicos e lavar dinheiro
INVESTIGAÇÃO
- LEONARDO SOUZA E HUDSON CORRÊA
Edson dos Santos
é sócio majoritário de uma empresa com nome imponente, Alumilax Indústria e
Comércio de Alumínio Ltda., voltada para fabricação e venda de metais. Basta,
no entanto, localizar a casa de Edson para constatar que a pompa em torno de
sua empresa se resume ao nome e ao objeto social. Edson, na verdade, é um
laranja, morador da favela do Preventório, em Niterói, Rio de
Janeiro. E a Alumilax não passa de uma empresa-fantasma. Edson e Alumilax
são parte de um intrincado esquema montado pelo jogo do bicho para desviar
recursos públicos ou lavar o dinheiro sujo que irriga o Carnaval
carioca. Ou as duas coisas juntas. A reportagem de ÉPOCA teve acesso, com
exclusividade, a um extenso levantamento feito pelo Ministério Público (MP)
estadual do Rio de Janeiro sobre as contas das escolas de samba. Somente no Carnaval de 2010, foram
identificadas 14 notas fiscais falsas, no valor total de R$ 1,25 milhão,
emitidas por empresas de fachada ou já desativadas em favor das escolas de
samba Mangueira, Imperatriz Leopoldinense, Mocidade Independente de Padre
Miguel, União da Ilha do Governador e Viradouro. Entre esses papéis,
estão quatro notas da Alumilax.
As escolas de
samba do Rio de Janeiro são a engrenagem principal de uma indústria que
movimenta cerca de R$ 1,5 bilhão por ano somente em gastos de turistas. A cada
noite de desfile, 120 mil pessoas circulam pelo Sambódromo. Cada escola do
Grupo Especial tem aproximadamente 4 mil integrantes. Para levar à avenida o
“maior espetáculo da Terra”, o Carnaval do Rio incorporou vários elementos
positivos do mundo dos negócios, como os patrocínios e o merchandising de
empresas desejosas de associar suas marcas à folia pagã. Mas, por maior e mais
caro que se torne a cada ano, o
Carnaval do Rio ainda mantém práticas nefastas distantes do capitalismo
benéfico que gera receita, impostos e empregos para o Rio de Janeiro e para o Brasil.
Notas fiscais falsas são comumente usadas para
justificar despesas que não existiram. A mercadoria não foi vendida, o dinheiro
não foi desembolsado, mas a transação foi registrada. Cria-se, assim, uma
margem financeira artificial que pode ser usada para esquentar dinheiro
ilícito, como os ganhos obtidos pelos donos do jogo do bicho. No caso descrito acima, seria como se os bicheiros
recebessem um cheque de R$ 1,25 milhão para lavar dinheiro sujo nesse mesmo
valor. O mesmo raciocínio vale para o desvio de dinheiro público. As escolas de samba simulam despesas a
partir dos recursos recebidos da prefeitura, mas não desembolsam as quantias
declaradas nas notas falsas. Dessa forma, podem destinar o dinheiro a outras
finalidades que não o financiamento dos desfiles.
Indiretamente, o próprio presidente da Liga
Independente das Escolas de Samba do Rio (Liesa), Jorge Luiz Castanheira,
admite práticas que se assemelham à lavagem de dinheiro. Numa audiência pública realizada pelo MP na última
quarta-feira, para discutir a aplicação dos recursos públicos no Carnaval,
Castanheira deu a entender que as
escolas de samba compram material ao longo do ano com dinheiro não declarado. Somente
depois de receber os repasses da prefeitura é que as escolas vão atrás de notas
para justificar seus gastos. Ele só não disse de onde vem esse dinheiro que,
num primeiro momento, financia as agremiações. “A verba deste ano só entrará
para o exercício seguinte. Vamos receber em janeiro. Em janeiro, estamos a
menos de um mês do Carnaval. Como é que eu consigo nota fiscal de ferro, de
madeira, de tecidos, de tudo o que já está sendo comprado agora? Eu tenho de
falar a verdade”, disse Castanheira, sem saber que havia um repórter de ÉPOCA
na plateia. Procurado após a audiência, Castanheira disse que se expressou mal
e que apenas defendeu a liberação do dinheiro da prefeitura com meses de
antecedência ao Carnaval. Ele afirma que a Liesa está afastada dos
contraventores do jogo do bicho e aberta à fiscalização. Castanheira disse,
ainda, que as escolas é que deveriam falar sobre as notas falsas.
O MP é taxativo ao afirmar que o Carnaval é usado
para lavar dinheiro sujo e recomenda que o Poder Público tome os devidos
cuidados ao se envolver com a festa. “O fato notório de o jogo do bicho usar as escolas de samba para lavar
dinheiro proveniente de atividades ilícitas torna mais interessante o uso de
milhões repassados pela prefeitura do Rio de Janeiro para compras em
estabelecimentos pertencentes a pessoas ligadas à contravenção”, escreveram os
promotores do MP.
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